God Save Fashion Week: Londres está mais apetitosa

O prazo de candidatura de designers à renovada London Fashion Week, na modalidade de diretório digital, terminou na sexta-feira - dia 25 de julho. Muitos são os posts, links e "breaking news" do anúncio das mudanças de modelo de dita semana de moda, 77 dias depois da nomeação da sua nova CEO - Laura Weir. Mas afinal o que muda? Obviamente que, para lá de sabermos o que muda, temos de perceber o que muda e para tal saber como era.

The Old Rules

Portanto para percebermos o que mudou precisamos de recuar ao meu verão igualmente quente (sim, o aquecimento global é mesmo real) de 2023… Enquanto estudava as diferentes semanas de moda para ter termos e medidas de comparação entre os principais catalisadores dos sistemas de moda em diversas geografias.

Correndo o risco de me auto-plagiar, mas sabendo que não me vão denunciar aos deuses académicos. Aqui vamos nós, este era o panorama da London Fashion Week em 2023:

Quanto à London Fashion Week, iniciativa criada em 1984 pelo British Fashion Council, muito há dizer sobre a semana de moda londrina, contudo nesta primeira abordagem salientemos o facto de Londres ser um hub criativo sem precedentes e de o British Fashion Council ter ligações a organismos governamentais, conceder bolsas de estudo destinadas a design de moda e apoios a jovens designers por projeto como o Vogue Fashion Fund.

Mas, neste contexto, o todo não é composto somente por critérios positivos. É de assinalar que os critérios financeiros necessários para que os designers se tornem membros do British Fashion Council serão, possivelmente, para muitos, incomportáveis. Uma vez que, para tal, as marcas deverão ter um nível de faturação superior a um milhão de libras anuais, para que possam contribuir para a instituição de forma proporcional. Contudo, uma estrutura pequena, como são as dos designers independentes, não tem possibilidade de produzir à considerável escala que resulta numa faturação de um milhão de libras.

A Revolução de Laura em 77 Dias

Já a mudança a implementar por Laura Weir assenta em diversos pilares. O fim das tarifas para os designers apresentarem as coleções fisicamente de agora em diante. Aumento dos fundos disponíveis para bolsas de apoio a jovens designers. O acordo de apoio governamental a três anos para a continuidade de BFC NEWGEN. O duplicar do investimento para atrair convidados de relevo desde imprensa, comentadores culturais e buyers. O compromisso da Burberry de continuar a apresentar em Londres e o compromisso de Jonathan Anderson de fazer uma apresentação, em Londres a cada season, seja qual for o formato da mesma. O foco renovado e reforçado da mentoria aos designers membros em termos de gestão e desenvolvimento de negócio.

É ainda dado grande destaque ao lançamento do projeto BFC Fashion Assembly. Projeto concebido pela jornalista e crítica de moda e embaixadora do BFC para o talento emergente. A iniciativa pretende aproximar os designers já estabelecidos com os estudantes de moda. O projeto piloto, que Weir descreve como um programa educacional criativo, acompanhará os designers a regressarem às suas escolas e universidades. Uma das principais intenções que é ainda destacada é a descentralização da ação do British Fashion Council a todo o Reino Unido. O que não quer dizer, e bem - se me é permitida a opinião - que o centro de onde partirá e viajará dita ação deixe de ser Londres ou a LFW.

O Novo Modelo

Este modelo que será implementado na London Fashion Week vai beber muito daquilo que é o modelo das semanas de moda independentes como a Lisboa Fashion Week e a Copenhagen Fashion Week. Não consigo evitar constatar que existem ainda taxas de apresentação de candidatura às várias modalidades disponibilizadas pelo dito Conselho de Moda.

Não obstante, este anúncio recebeu o selo de aprovação da plataforma 1 Granary. Digo selo de aprovação, uma vez que o trabalho de ativismo por uma indústria da moda melhor e de promoção de designers independentes. Sendo o trabalho de ativismo feito, muitas vezes, com humor e, como já classificou a sua fundadora - Olya Kuryshcuk, as críticas que fazem vêm sempre de um lugar de amor à moda.

Ainda que grande parte da atuação da 1 Granary se foque atualmente no Substack, neste caso pronunciaram-se no Instagram. Da seguinte forma:

O panorama da moda londrina tem-se sentido estagnado há algum tempo. Os preços a subir, o apoio a escassear, e os criadores emergentes mal conseguem manter-se à tona. A criatividade continua lá, mas o sistema não tem facilitado a sobrevivência, quanto mais o crescimento. Por isso é que as mudanças anunciadas pela @laura_weir no @britishfashioncouncil parecem realmente ser um possível ponto de viragem. Adorámos, de forma particular, a nova BFC Fashion Assembly, criada pela @sarahmower_, que leva os designers de volta às suas antigas escolas por todo o Reino Unido, ajudando os jovens fora de Londres a vislumbrar um futuro para si mesmos na moda. É uma ideia simples mas com impacto: tornar a indústria mais aberta, mais local e mais acessível.

O Novo Calendário

Depois de em abril ter sido anunciado o cancelamento da edição que deveria ter lugar em junho, na quarta-feira passada foi anunciado o calendário da próxima edição a decorrer de 18 a 22 de setembro.

Sendo o primeiro evento uma apresentação da universidade de Birmingham, sendo a abertura "oficial" realizada na sexta-feira com um pequeno almoço. A colaboração com JW Anderson terá a forma de um jantar também no dia 20 de setembro. A Burberry fechará o evento em termos de desfiles na segunda-feira, dia em que a agenda se desdobra vastamente entre o físico e digital. A festa de encerramento fica a cargo da colaboração BFC com a revista Outlander. No espetro oposto aos designers encontramos, como parte do calendário, por meio de diferentes projetos: a Zara Collection, Ebay e H&M. Participam ainda do evento nomes como Stephen Jones, Patrick McDowell, Roksanda, Richard Quinn, Marques'Almeida, Erdem ou Simone Rocha.

Dear Governments: A Moda Precisa de Vós

Apelemos aos governos que olhem para o exemplo inglês e que invistam na moda, que deem e centralizem apoios nos seus maiores defensores e catalisadores - as semanas de moda. E não vale argumentar que os milhões de euros foram dados e não surtiram o efeito pretendido. A culpa, especificamente do que aconteceu em Portugal recentemente, não está na moda. A culpa está em atribuir-se fundos ao sucedâneo de fashion week e não na verdadeira fashion week.

Podes usar fermento, mas se o colocares na tigela vazia, enquanto ao lado tens uma tigela com os melhores ingredientes…

Apelemos também ao patronato na moda. Porque não é uma prática tão generalizada ou normalizada como na escultura e pintura? Se há muito que a moda também tem o seu lugar devido nos museus… Mas esta é uma questão que dá pano para mangas pelo que ficará para outro ensaio.

Plot Finale: O Futuro da Moda Independente

E terminamos tal como Laura Weir terminou o seu discurso:

"A moda não é só sobre desfiles e peças de roupa. A moda dá-nos uma antevisão do próximo capítulo da sociedade. É tempo de escrever uma nova história juntos"

Que história gostava eu que se escrevesse como designer de moda de formação, Substacker e autora de The Fashion Standup? Que se dê a merecida atenção e mérito à moda independente e aos seus creators: designers; creators digitais; estruturas e organizações; maquilhadores; cabeleireiros; manequins; escritores e jornalistas; modelistas, modistas e costureiras… E todas as pequenas equipas e projetos a solo.

Qual seria para ti uma nova história ideal para a moda?

Até breve!

Com amor,

Vera Lúcia