Fashion Graduates Chronicles: Asas para Voar - Final Cut

Fashion Graduates Chronicles: Asas para Voar -  Final Cut
Fotos a preto e branco: Fred Ferreira via @eabbondanza. Fotos a cores: Elvira Pomar.

Este texto faz parte de um extenso e intenso ensaio, na melhor aceção possível - "Fashion Graduates Chronicles: Asas para Voar". O ensaio tem como objetivo celebrar as coleções apresentadas no dia 6 de junho pelos alunos do Mestrado em Design de Moda na Faculdade de Arquitetura da Universidade de Lisboa.

Recomenda-se a leitura das três partes que o compõem. Não sendo obrigatória a leitura sequencial, adverte-se que o único efeito secundário registado foram os elevados níveis de inspiração induzidos pelo trabalho destes designers.

Se ainda não leu as doses anteriores de criatividade, pode fazê-lo clicando nas seguintes opções: Parte I ou Parte II. Agora, continuemos esta jornada inspiradora com os restantes protagonistas desta história.

Fotos da coleção : Elvira Pomar.

Maria Cruz

Comunicação visual, comunicação social, comunicação no geral, styling, marca que lhe faça sentido, quem sabe na Loewe, ou na sua marca própria… ser feliz na Moda!

O ambiente da faculdade foi uma "bolha" longe do mundo exterior ao seu processo que lhe permitiu um foco absoluto e pleno.

"No fundo, só sei que daqui a três anos, tenho que estar tão realizada quanto estou agora, pelo menos, já me sinto bastante bem agora, com um trabalho que me permita crescer e que não fique estagnada nesse trabalho (…)"

"Riscas de Ontem" advém dos deslumbres da imaginação de Maria em criança, Circo e Equitação.

Assumiu as suas preferências face àquilo que gostava, sendo que isso levava Maria a apresentar à Professora Eduarda, a cada tutoria, um conceito diferente… A sagacidade acidental levou-a a descobrir o seu fio condutor - o kitsch. O kitsch permitia toda a amalgama de referência e uma coleção que espelha quem ela é a vários níveis e principalmente como designer.

O processo de confeção foi o que mais a fez crescer… Por entre as pequenas discussões de turma, o casaco azul e amarelo em burel às riscas (que literalmente lhe tirou o sono), as conversas entre colegas no escuro da noite enevoada pelo fumo dos cigarros… Cigarro que também está estampado na coleção, na foto do pai da designer com dois anos de cigarro na mão…

No fundo, tudo contribui para originar o desfile perfeito, o dia que foi tão bonito!

Bárbara Eusébio

Sendo a música algo tão importante para a designer desde a infância, a sua coleção foi inspirada pelas influências da música rock e blues e emoções transmitidas pelos artistas em palco. Assim mistura referências da moda dos anos 70 e 80 do século XX, nomeadamente, o contraste entre as peças fluidas e as peças justas ao corpo.

Ao mesmo tempo, conceptualmente, imprime aspetos de glam rock e dork glamour. Num processo mais complexo do ponto de vista da transposição e da comunicação de algo que para a designer tem um significado tão profundo, especial e complexo. Sendo esta uma capacidade que Bárbara tenciona aperfeiçoar futuramente.

O desfile foi o materializar de um desejo ansiado - a primeira coleção autoral. COVER (IT) é o espelhar de uma crença profunda da jovem designer - o propósito da música é fazer-nos sentir vivos.

Não obstante, esta é também união e partilha, partilha essa que Bárbara também destaca - a partilha de motivação durante o processo de conversão ou a partilha de um momento de orgulho imenso ainda que efémero - a partilha com a turma.

"Se há algo que aprendi é que por vezes as melhores trilhas são aquelas que nós não planeamos. Mas uma coisa é certa: para o meu futuro quero um trabalho que me faça sentir realizada, e que me possibilite aprender novas perspectivas para trabalhar os materiais e diferentes abordagens para encarar o processo criativo."

Afonso Correia

Dar continuidade ao seu corpo do trabalho e explorar alfaiataria eram os objetivos de Afonso quando ingressou no mestrado. Objetivos que alcançou através da coleção, mas sente que ainda tem muito por explorar, sendo a exploração também descoberta, futuro e viagem.

Tal como os seus colegas, refere a turma e a sua importância, diz-me que não poderia estar mais grato pelos seus colegas. Ao contrário de alguns colegas não se sentiu totalmente em piloto automático, por breves instantes conseguiu expressar para si mesmo a gratidão de onde tinha chegado como designer, dizendo até e ressaltando com a devida humildade mas também com alguma ousadia - como "couturier". Tendo, no entanto, plena consciência que nunca mais deixará para o fim de um projeto cinco cós com presilhas.

Agora tem a leveza de ver este momento com algum sentido de humor. Agora depois de ter concluído a sua coleção, na qual se inspirava no trabalho dos designers Martin Margiela e Miguel Adrover. Coleção que explora a desconstrução aplicada a roupa masculina formal e à alfaiataria.

O fascínio por blazers, o desejo de trazer para moldes tradicionais, como os do menswear e da própria alfaiataria uma nova perspetiva, uma nova abordagem - uma abordagem sua, da sua idiossincrasia, a motivação de dar continuidade ao seu corpo do trabalho da licenciatura em Belas Artes com foco em pintura foram os componentes que costuraram o ponto de partida do início de Afonso como designer de moda.

"Viajar para nós (artistas e designers), se for feito da maneira correta, é trabalhar e eu quero trazer novos modos de pensar e de fazer para o nosso país."

Mafalda Sousa

Daqui a três anos Mafalda imagina-se a trabalhar nesta área que estuda com todo o seu amor e paixão, a Moda - e a criar numa empresa que admire.

Durante o processo, até aos últimos momentos levou o seu corpo ao limite. A ajuda veio da compreensão e respeito entre todos e do apoio ímpar da família e conseguiu.

"Logo que deram como finalizado o desfile só sentia ainda adrenalina, felicidade e fogos de artifício explodiam visualmente na minha mente. Quando já estava de viagem para casa o meu corpo adormeceu, mas lembro-me do sonho simples em que estava a gritar que tinha conseguido!"

Para começar invoca William Shakespeare "ser ou não ser, eis a questão". Neste processo de aprendizagem queria uma coleção sua, só sua e não ao gosto dos outros. Foi inspirada pelo seu diagnóstico de PHDA (perturbação de hiperatividade e défice de atenção) e dislexia. Diagnóstico que a levou a reprimir os seus comportamentos para ser aceite na sociedade. Ao longo do tempo esta repressão tornou a designer na pessoa que os outros queriam que fosse… Tendo sido apelidada de "Boneca de Trapos".

Foi exatamente no conceito "Bonecas de Trapos" que pegou, depois de muita pesquisa chegou ao livro "Make your own old-fashioned cloth doll and her wardrobe with full-size patterns", de Claire Bryant, onde encontrou as referências aos folhos e às pregas associadas a este contexto. A que juntou o patchwork com o upcycling de materiais inerente.

Estas técnicas assumem a representação do ser da própria Mafalda: os folhos representam o que os outros pretendiam que fosse, moldável aos seus gostos; as pregas correspondem à sua persistência, apesar de todos os acontecimentos que teve, é tida como teimosa por enfrentar as transformações que a faziam sentir mal; o patchwork simboliza as suas feridas e aprendizagens, criando um conceito de belo e feio, de alguém vista como monstro por alguém dito "normal".

Fotos da coleção em backstage: Elvira Pomar

Elvira Pomar

Sempre quis fazer Licenciatura em Design de Equipamento e Mestrado em Design de Moda. No seu futuro utópico gostava de trabalhar em Portugal dentro do Branding, Visual Merchandising e o encontro do espaço e dos eventos com a Moda.

Elvira já trabalha na área, no atendimento ao público em lojas da Moda de Luxo, tendo começado recentemente a trabalhar a tempo inteiro para Bottega Veneta, há algum tempo. Ao que acresce o facto de já ter sido assistente de uma profissional da área que muito admira - Rita Rolex. Sabe que uma carreira se constrói passo a passo e com tempo, mas esta designer já começou a caminhar.

"(…) acho que tivemos a sorte de ser uma turma grande, mas bastante unida. Sinto que para além disso, tivemos a mentoria da professora Eduarda que nos ajudou muito e que nos guiou a todos com todo o entusiasmo que ela podia dar, mas acabamos por nos ajudar muito uns aos outros."

Ainda que tenha a perspetiva que esta será a única coleção que fará, uma vez que deseja que o seu futuro passe por outras vertentes da indústria da moda, sente que este processo e desafio lhe conferiram valiosas competências e aprendizagens para o futuro.

"Suave" vem do português suave, arquitetura portuguesa. Enquanto grande inspiração é o filme da nouvelle vague portuguesa, "Verdes Anos" de Paulo Rocha de 1963. O filme favorito da designer no qual se sente identificada com a descoberta das personagens do bairro de Alvalade, bairro que também ela descobriu ao mudar-se recentemente. E as maiores referências visuais dos seus coordenados acabaram por ser elementos da verdadeira protagonista da longa metragem — a cidade de Lisboa.

Laura Worm Ramos

A questão de inspiração é central para todas as coleções, mas no caso de Laura ganha mais força pela sua multiplicidade. Inspira-se no facto de ser inspirada, inspirada pelas suas primas, mais velhas que ela e referências da sua infância. Em contraponto deseja que a sua coleção venha a inspirar a sua sobrinha de quatro anos.

Inspirar crianças tal como foi tão inspirada é um dos seus objetivos futuros. Não tem um plano super delineado, contudo acredita que a curto prazo o melhor caminho para si sejam os acessórios, onde poderá dar asas à sua criatividade.

Contrariamente aos seus colegas, o processo de Laura não foi marcado por constrangimentos técnicos, mas tal como Talmo pelo amor à sua avó, ainda que de forma diferente.

A preocupação com a doença da avó impedia muitas vezes o sorriso de Laura durante o processo de confeção, ainda assim terminou as peças antes de tempo. E destaca momentos felizes da turma, momentos particulares como a viagem a Guimarães e o aniversário de Talmo.

"Curiosamente depois do desfile não tive um vazio como a Professora disse que iríamos ter, (…) no dia seguinte, visitei a minha avó que ainda estava internada, ela ficou tão orgulhosa, chamou todas as enfermeiras para verem as minhas malas inspiradas pela sua terra natal, a terra do dinossauro."

Para construir a sua coleção tentou ver o mundo pelos olhos da sua sobrinha, ao mesmo tempo que pegava em referências da sua adolescência como "a princesa da pop" Avril Lavigne. O desejo maior era que a sua sobrinha olhasse para aquilo que Laura criou e se sentisse tão inspirada como esta se havia sentido outrora pelas suas primas. Assim, visualmente, foi incontornável a influência da prima espanhola da designer, que esta via como "vivendo no outro patamar", filha única vestia Ágatha Ruiz de la Prada. Era o futuro idílico de Moon.

Carolina da Costa

A resposta para a génese da coleção de Carolina estava na biblioteca, mais precisamente no livro "Uniformes: Ordem e Desordem". Os uniformes e a ideia de que queremos, como seres humanos, pertencer a um grupo e ao mesmo tempo ser individuais são aspetos, tanto tangíveis como intangíveis, que sempre fascinaram a designer.

Não só a uniformização por profissão, mas também por grupos sociais que se uniformizam de diversas formas. Como é o caso dos punks - que se uniformizam através do corpo vestido, da música e demais interesses.

No livro que refere descobre os Tobi, trabalhadores da construção civil japoneses, que ainda que envergem uniforme, este tem mais flow, é mais baggy, mais expressivo. São um grupo, são uma equipa mas não envergam exatamente a mesma indumentária, pois tal anularia a sua identidade. Carolina traz-nos a sua interpretação do Tobi.

De futuro vê-se a trabalhar em atelier, não querendo ter uma marca própria. Gosta de costurar, gosta de fazer draping, molde e de trabalhar em detalhes. Prefere ser mais calma e projetar a prazos curtos, três meses de cada vez.

"No dia a seguir ao desfile (…) a Professora Eduarda enviou-nos mensagem (…) a dizer que nos devíamos estar a sentir-nos vazios, disse para estarmos juntos e comermos chocolate (…) foi mesmo bom ir ao concerto e estar com os meus colegas (…) já não estava vazia sozinha."

Reflexão Final

Modéstia à parte, de todos os ensaios e projetos dentro do The Fashion Standup, não pela receção - mas pelo processo tal como muitos designers aqui referiram. A perceção do talento, que não se limita à criatividade, assenta em valores de liberdade, de auto-expressão e empatia.

Resistência, política, questionamento pessoal, comunidade foram tónicas avidamente sublinhadas… Como não me sentir orgulhosa desta geração que me sucede neste percurso da primeira coleção no âmbito do mestrado?

Sendo simultaneamente a próxima geração e a minha como Gen Zs…

A Moda Portuguesa,
A Moda em Lisboa,
A Moda que nasce no alto
de uma das sete colinas tem futuro,
Um futuro brilhante!

Até para a semana!

Com amor,

Vera Lúcia